— Cuidado.
— Como?
— Essas brincadeiras que você faz. Só tome cuidado.
— Você tá falando do “Vai pela sombra”?
— Claro. Nunca se sabe.
— Eu é que não sei do que você tá falando.
— Você diz “Vai pela sobra” pra alguém, de repente o Diabo se aproveita disso, e vai saber o que pode acontecer.
— O Diabo?
— Ué, tá rindo de quê? Qual a graça?
— Como “qual a graça”?
— Eu tô falando sério. O Diabo é legalista.
— Espera. Você jura que não é piada?
— Jurar, eu não juro, porque a Palavra diz “sim, sim; não, não”. Mas é, eu não tô brincando. Não tô nem vendo a graça, inclusive. O Diabo é legalista.
— Você também é?
— Oi?
— E Jesus? Jesus é legalista?
— Veja bem. Jesus respeita legalidades.
— Então, sua resposta é “sim”.
— Não, não… Eu apenas…
— Olha, se você tá falando sério, não deve tá vendo a graça, mesmo… Desculpa. Achei que era piada. Vamos deixar isso pra lá.
— Ah, mas agora eu faço questão de entender por que achou engraçado. Não se brinca com o Diabo e… Tá rindo de novo?
— Desculpa! Mano, a gente não vai se entender. Vamos mudar de assunto, tá?
— Qual…! É…! A graça?!
— Não é nada demais. Eu só não sabia que você acreditava no Diabo como essa pessoa tão poderosa. Só isso. Mas vamos falar de outra…
— Mas o Diabo tem poder! Vai me dizer o que, agora, que não tem?
— …
— Fala!
— Você tá falando sério mesmo ou…?
— Claro que sim, cacete! Vai dizer que o Diabo não tem poder?!
— Mano, Jesus disse que todo o poder na terra e no céu pertence a ele, então acho que não sobrou muito pro Diabo.
— Não é questão de sobrar. É questão de que tem!
— Então… O que você tá me dizendo é: Jesus disse isso aí, mas não tava falando sério.
— Meu Deus! Você realmente acha que Satanás não é poderoso! Tô chocado… Meu Deus!
— Cara, fica calmo. Não tem problema a gente não concordar sobre isso. Eu entendo você. Já pensei da mesma maneira. Só que hoje eu acredito que qualquer coisa em que depositamos nossa crença exerce algum poder sobre a gente, mesmo que seja no campo da imaginação. Então, se você acredita com muita força que “o Diabo” tem poder, essa ideia vai influenciar a forma como você interpreta os eventos ao seu redor que pareceriam obra “do Diabo” e…
— Posso saber por que esses dedos fazendo aspas no ar quando você diz o nome do Inimigo?
— Eu…
— Pare de enrolar e responda de maneira objetiva. Satanás tem poder ou não?
— Não.
— Meu DeeeeEeeeEeeeeEEeeeeeuuus! Meu. Deus. Do. Cééééu! Olha, eu fico indignado!
— Relaxa, mano. Pode ter certeza que, se o Diabo existe, ele sabe que você é um grande fã.
— Se ele existe? Se ele existe?! Mas era só o que faltava, você agora questionar a própria existência do Inimigo!
— Acho que você ficaria menos ofendido se eu dissesse que Jesus não existiu… Desculpa, então.
— Isso não tem nada a ver com Jesus! Não mude de assunto! A gente tá falando do Diabo! Do Di-a-bo!
— Sim, o poderoso…
— Isso! Não! Cala a boca!
— …
— …
— Eu vou indo, tá? Não se ofenda, não, que era brincadeira.
— Você precisa estudar a Bíblia, meu irmão! Está indo por um caminho perigoso.
— Mano, eu estudo. É por isso que eu sei que, na Bíblia, a palavra “Satanás”, que usamos como nome próprio, foi atribuída a uma entidade espiritual, a um ser que serve de conselheiro de Deus, a homens em posição de poder, a pessoas comuns como um dos discípulos de Jesus, e a poderes políticos, de modo que a existência de um ser chamado Diabo vem sendo questionada pela Igreja há séculos. Mas não tem problema se você acredita nele. A gente não precisa brigar por isso.
— Ah, sim! Então é isso! Você se acha mais espiritual que eu, né? Cuidado com o Humanismo, meu irmão! Cuidado com o orgulho!
— Nossa… Pode deixar, mano. Eu vou pela sombra. Se eu topar com o Diabo, aviso que eu acredito que Jesus tem todo o poder, mas que você é #TeamDevil!
— Herege! Volta aqui! Volta aqui, seu…! Vá pro inferno!